amores expressos, blog da Adriana

sexta-feira, 29 de junho de 2007

A quatro mãos e quatro pedais

Castelo de Saumur, construído no século XIV pelos duques de Anjou, nas margens do rio Loire.
Escrevemos o texto abaixo após reflexões a bordo de um espumante.
Entre parênteses.
Os americanos não entendem por que os europeus estão diminuindo a carga horária de trabalho e ainda assim conseguindo ter uma produtividade maior do que a dos profissionais deles. Para quem vive o dia-a-dia com os americanos é fácil perceber onde está o problema. Segundo Al-Cunha, se um americano quer escrever um manual de procedimentos de Como Subir Uma Escada (esqueça Cortázar), a coisa acaba em pelo menos dez páginas descrevendo passo a passo o processo, desde o momento em que a idéia de subir a escada é concebida até o momento de colocá-la em prática (incluindo análise de riscos e estudos de viabilidade), de forma que qualquer imbecil saiba o que fazer nessa situação.
Isso, levado para as grandes corporações, significa investimentos pesados na elaboração desses procedimentos, de modo que a qualidade tenha um padrão mínimo à prova do percentual de imbecis que haja na corporação.
Enquanto os europeus investem em ter menos imbecis, os americanos investem maciçamente em tornar suas corporações à prova de imbecis.
Isso tudo foi inspirado pelo passeio de bicicleta de sete horas de duração pelo Vale do Loire, trecho entre Saumur e Montsoreau.
Quando nos informamos no bureau de tourisme de Saumur sobre o percurso, nos disseram para seguir as setas verdes no chão, demarcando as ciclovias. Começamos fazendo isso, como se fosse um manual norte-americano de subir escada. Isso até o momento em que as setas repentinamente desapareceram do chão.
Neste caso, depois de seguir pelos vinhedos de estrada de terra por uns 30 minutos (com bicicletas apropriadas para asfalto), tivemos que usar o nosso senso de direção e poder de dedução para começar a enteder que, por ali, mais ou menos já equivalia a cem por cento. Voltamos. Seguimos por outro canto. Voltamos. Continuamos por acolá. Voltamos. E, com um pouquinho de bom senso e um bocadinho de sorte, achamos o caminho certo.
No fim, tudo bem, tudo ótimo, é bom comentar essas coisas depois que elas acontecem. Terminamos o percurso de 14 quilômetros apesar desses desvios, de ladeiras subidas em duplicata etc, e voltamos numa boa, margeando o rio.

Ainda sobre os americanos lá de cima, para concluir: eles criaram essa história do "80-20", que significa que você deve investir em 20% das questões que resolvam 80% dos seus problemas. Na prática, a maior parte do mundo adotou esse método – mas os próprios americanos não conseguem ser bem sucedidos nele.
O Loire sinalizou um percentual significativo do caminho pra gente. O resto foi aventura. Numa boa. Heróicas as velôs, heróicas as nossas pernas, e o resto - festa para os olhos.
(Por Paulo Al-Cunha, vulgo “Gurevitz” (também conhecido como “Gureba” nos becos do Rio de Janeiro), e Adriana Lisboa. Num break de Paris por dois dias, em busca da Idade Média.)
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Inspirado pelo Castelo de Montsoreau, que hoje abriga entre suas paredes uma exposição super high-tech, muito bacana mesmo, Alexandre Dumas escreveu La dame de Monsoreau (comendo o t).
Ao longo do verão, Jacques Le Goff, o grande medievalista, vai dar uma série de palestras na Abadia de Fontevrau, nessa região, sobre seu novo livro, Héros et mérveilles du Moyen Âge.